Pandemia - Nicolas Santos

22/04/2018

Me sinto decepcionado por já ter acordado, por pensar em você, por nunca te ver. Sinto falta, disse o criado-mudo. A sociedade está muito disposta a não estar disposta. Preparo-me para quando toda cor, virar resquício. Toda dor, virar motivo, preparo-me para ter e sentir saudade. Na tua lobotomia, intensidade, esqueceu que tudo é metade, aprendizado para ser, afastamento proximal. Sei que mentes, sei que minto, universo colapsa-se e todo dia é semana. Sei que mentimos, sei que mentiremos. Tens essa seriedade sóbria, cômica, pois todo ato é passo, quem por nós? Nada, ninguém. Pedaço de céu divide-se com quem fornece. Intimidade é porta, ponte, é janela. Solidificar passa por saber mensurar, mas o que é saber? Só mais um jeito de lidar. Nem todo sono, tem sonho, param em muros e logo apontam o pesadelo. Dedos e mãos, cachos e riachos, vermelho e verde, olhares práticos. Passo de lado, para cada, passado, passo dado, passada a noite, desfruto, futuro, desses inseguros. Poeta, não, poesia, quem sabe, detesto. Desfiro o olhar iconoclasta, maldigo o automático, prefiro a ciência de ter ciência, quiça sem pretensão, desejo impulsiona. Se soubesse como a lua se odeia, teria ainda menos auto-estima. Tens insegurança, oras, estamos vivos. Isso é, isso não, distinguir seria ingenuidade compassiva. O recuo da autonomia é perda para a sociedade. Saber lidar e compreender junto a perspectiva que adotas, o zeitgeist. A inocência é fábrica de vítimas.

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