Outro sobre você - Nicolas Santos

02/02/2020

Ela sorri como se a vida fosse boa, derretendo quaisquer resistência, inaugura novo nexo, desfaz o sentido e revida com delicadeza. Amarra o cabelo e mantém-se equilibrada, algo quase tibetano comprado em algum site americano, algo quase agradável, adorável. Mal a conheço e certamente ela não me conhece, nem eu mesmo indico-me, retrato da infância dói dobrado, tudo o que fora sentido, fotografado, esquecido, vivido. Mas não engana, senta junto a quem pode, desamarra as pernas do concreto e movimenta-se, como em uma cena, corta, de novo. Corta o meu rosto. Ó vento cruel, para quê? Deixe ela seguir, caminho só é bom para quem sabe ir, mesmo que de mãos atadas, cobradas, coloridas, coloradas. Olhos gigantes que mesmo quando sorrateiros desfazem o país inteiro. Também tem aquelas marcas únicas, coisas que se herdam, coisas que nascem com quem nasceu. Um dia e tudo já morreu. Defeitos possivelmente ela os tenha, ainda não percebi, a não ser como podes ser intimidante, radiante, apaixonante. Dos meus braços que não abraçam as marcas, as cicatrizes feitas a própria mão, nunca entendem, nunca entenderão. Escuridão é olhar para o céu e só ver estrela que não estreia, estrela amarela. Isso tudo é para não me esquecer, que ela não é você, eu gostaria que fosse você.

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